Minha Vida com o Palocci


No meio do feriadão eu acordo pensando no meu amigo palocci. Pensando que ele foi no meu casamento, que ele foi casado com duas grandes amigas minhas. Que eu, saindo duma daquelas festas da usp, levei todo mundo, cada um pra sua casa, no carro dele pq tava todo mundo bêbado, menos eu que não bebia e não bebo até hoje. Que a vida dá voltas e que, por conta deste passado, não consigo odiá-lo, mas sim apenas ficar muito triste, triste como quando um amigo faz uma cagada e te fode e fode com a amizade, mas não fez por mal. Não existe ódio pq, para mim, ele é uma pessoa e não uma figura pública. Só decepção e tristeza.
A tristeza fica por conta do quanto queremos e do que fazemos pra ter o que queremos. Fica por conta do tanto que podemos passar por cima dos outros para atingir nossa meta. Minha cabeça se quebra em duas pessoas q se sobrepoem, uma real da juventude e outra pública q deda para continuar a viver no mundo de dedadas e imagens. Um mundo em que os inimigos se encontram e se beijam e se convidam pra tomar um drinque juntos.
Não dou conta desse mundo. E, ao mesmo tempo, não foi o mundo do palocci, do lula, do fhc e do aécio que caiu em mim e eu não dei conta. Tive amigos mais proximos que optaram pelo dinheiro e pelo poder e não tiveram nem a finesse de me olhar na cara. Provavelmente hoje, ironicamente, estejam criticando a covardia do palocci pessoa pública enquanto enfiam a propria covardia no final do trato digestório.
Hoje eu acordei no meio da independência e pensei que vamos continuar voltando. Até chegar o momento em que pensar que a terra é plana nao vais ser mais um meme. Vai ser real. Avançaremos no retrocesso até o necessário. Uma onda de resignação assolou meu ser. Lembrei do Tao te King, Avançar é retroceder, retroceder é avançar. Penso nesse momento como a hora exata em que a mão puxa a flecha no arco para que ela ganhe energia potencial para ser disparada. Retroceder é avançar. Uma onda sobre a inutilidade das redes sociais como promotoras da mudança abateu-se sobre mim. Não assino petições, não compartilho correntes, mesmo que concorde com elas. Não quero mais este torpor. A religião é o ópio do povo. Mas as redes sociais são a cocaína da parcela esclarecida da população em que me incluo. Uma cocaína que entorpece com a mentira da lucidez e da falsa sensação de estar batalhando por um mundo melhor sem sair de casa.
Hoje acordei pensando no passado como uma roupa velha que não nos serve mais e que eu ainda insisto em tentar vestir. O palocci da faculdade nao me serve mais, eu engordei. Mas, lá no passado, tanto eu como ele nos servimos.
O passado me chama e seduz. Ao passado tudo é permitido e perfeito justamente pq ele já passou. É nele que mora nossas referências e é lá que tudo parece melhor quando o aqui/agora parece horrível. Artimanhas de defesa de nossa psiquê.
O momento realmente não é bom. Mas meu momento é. Tenho felicidade em mim, apesar de tudo. Tenho felicidade em ter certeza que não pertenço mais aos lugares que me deixaram neste ano que passou. A crise está aí mas eu nao a sinto. Não por ser dissociado, mas por ter esta felicidade é azul de ser feliz e (quase) livre das pessoas nefastas.
Acho que até mesmo o passado recente é uma roupa que não me serve mais. Escrevo um post falando sobre a necessidade do professor encantar o aluno como uma falácia pedagógica, mas como uma verdade do mercado educacional atual. Um ex colega da escola em que fui demitido toma as dores do mercado e vem no meu post defender a loja e o dono da loja. Fico achando que ele não entendeu nada. Tiro uns sarros dele pq não vale a pena argumentar mais forte pq o argumento vai ter que ir com bula e tenho preguicinha. Ele fica nervoso rápido, penso eu, e voa na minha goela dizendo que eu penso assim pq fui demitido. Fico com vergonha por ele. Independente de ser verdade ou não, fico com muito vergonha de alguém precisa usar um canhão de raio laser potencia máxima pra matar, supostamente, um pernilongo (eu). Fico com muita vergonha. Se eu olho pro passado, este colega tb não me serve mais. Eu realmente engordei. Mesmo assim, é no passado que eu busco ainda algumas referências e saudades. Será por isso que tenho sonhado tanto com meus pais?
Hoje de manhã, comecei a xingar o desgraçado do microondas pq ele simplesmente não parava de ligar sozinho e eu queria esquentar meu leite. Xinguei xingamento microondofóbicos, microonxistas, xinguei como se não houvesse amanhã. Este microondas, a claudia ganhou do meu pai quando ainda morava sozinha. Foi o primeiro eletrodoméstico não necessidade básica dela, na época da pós. Volta e meia ele liga sozinho, quer dizer, faz barulho que vai ligar mas nao liga. Dai temos que ficar apertando o botao de start dele até uma hora que ele resolva funcionar. Por isso gritei e xinguei o coitado.
A Claudia disse alto lá da sala, Tá na hora de comprar um novo!! No que eu retruquei, Nossa, coitado, ele tá velhinho, vai se desfazer dele assim? E ela, Cleido, vc é tonto? Lembra que quando ameaçamos ele, falando que vamos trocá-lo, ele volta a funcionar? Então, tô só fazendo terrorismo-eletrodoméstico.
O passado pai de microondas me acalma já que o presente tem outro pesar, por enquanto. Tiro o peso do presente, pesando o amor e saudades do que já foi. Tenho afeto pelo microondas velhinho. Ele máquina pensa menos em dinheiro e poder que muita gente que achava que conhecia, mas conheci de verdade mesmo no final do ano passado.
Tudo agora é roupa velha que não me serve mais. Menos a minha família e meus amigos verdadeiros que são puro algodão com elastano, são capazes de acomodar meu reajustes corporais. Um dia não vou ter mais raiva e nem mágoa de ninguém que me fudeu. Mas não vai ser hoje.

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